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sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

A Revolução Feudal

Abigail Pereira Aranha

1) Introdução

Se nós viajássemos no tempo para a Europa em 51 a. C. e depois em 1450 d. C., nós ficaríamos admirados com quanto o mundo ficou parado ou andou pra trás em 1500 anos (o ano depois de 1 a. C. não foi 0, foi 1 d. C.). E se nós soubéssemos que de cerca de 1450 a 1420 anos antes daquele 1450, o Filho de Deus "se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai" (Jo 1: 14), ficaríamos mais espantados ainda. Porque a História do mundo (não só da Europa) foi de reis tomando os reinos e escravizando o povo dos outros, dificuldades de comunicação física e cultural entre as cidades, mortalidade alta por doenças quase banais, analfabetismo quase universal, ruas e estradas horríveis, casas horríveis, vida pavorosa e mortes estúpidas. E qual é a relação entre o Filho de Deus vir ao mundo para salvar as nossas almas e ele nos salvar de uma vida f%$£da neste mundo? Total, a última coisa é consequência da primeira, porque o nosso planeta Terra é tão criação de Deus para a humanidade quanto o Céu para onde os salvos vão (Gn 1, Mt 25: 34). E até isso precisa ser lembrado, ou até isso precisa ser explicado, e, para muita gente, até isso parece um absurdo. E essa estranheza é obra da igreja que diz ter sido criada pelo próprio Filho de Deus salvador. Naquele 1450 d. C., essa Igreja Católica Apostólica Romana tinha mais de 1400 anos de existência segundo ela mesma e os seus fieis, com mais de 1100 anos de autoridade política e sociocultural sobre a Europa.

Então, vieram a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. A Revolução Industrial começou em torno de 1760. A Revolução Francesa marcou a passagem da Idade Moderna para a Idade Contemporânea, em 1789. A Revolução Industrial, a Revolução Francesa e, mais adiante, a segunda Revolução Russa nos deram quase qualquer aspecto do que consideramos vida humana decente hoje, e até coisas que fazem parte da nossa vida atual que nem percebemos. Por exemplo, eu não teria chance na "mainstream media" ou talvez sequer num pequeno jornal no fim do século XX, mas se um pobre do continente americano pudesse ler um texto meu em um desses veículos naquela época, isso aconteceria porque ele passou pela escola pública, não é escravo, vive em um Estado laico (mesmo se o país for cristão) e, se ele tiver mais de 40 anos, não morreu de doença transmitida por ratos ou água suja; e porque eu também passei pela escola pública, não sou escrava, não fui obrigada a me casar com um católico fervoroso aos 16 anos e não corro risco de prisão ou morte por heresia. Ah, a imprensa não foi feita para imprimir a Bíblia. Ainda volto a essa parte.

É como dizia um meme da ATEA (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos), publicado acho que em 2014 no Facebook: "200 anos de Ciência nos levaram à Lua, milhares de anos de religião nos levaram à Idade Média". Sim, isso é uma evidência de que deuses não existem, de que Jesus Cristo não foi um personagem histórico, de que a Igreja Católica só está viva até hoje por atavismo de filhos de semianalfabetos, e de que a religião em geral e o Cristianismo em particular têm pouca conexão com o mundo real e com a inteligência humana. Então, como os cristãos comuns podem defender sua fé e os clérigos podem defender os seus ministérios? São duas vias. A primeira via é a da associação do Cristianismo ao progresso da humanidade na Idade Contemporânea e a desassociação do Cristianismo do analfabeto reacionário e com horror ao sexo que era o cristão típico até há poucas décadas. O melhor que eles fizeram foi o Instituto para Pesquisa da Criação, mas no geral, os cristãos que seguem essa linha abrem as portas das igrejas para a esquerda anticristã. Aí, eles caem em falácias como a Teoria do Dia-Era, a teologia negra ou as igrejas LGBT. A segunda via, em que eu vou me concentrar aqui, é a do louvor aos "tempos antigos", que eu vou chamar aqui de Revolução Feudal.

2) Isto também é Revolução Feudal, mas acanhada

Eu disse lá atrás que uma reação dos cristãos do século XXI ao progresso depois de quando a Igreja foi apeada do poder sociopolítico foi associar o Cristianismo ou a própria Igreja Católica Apostólica Romana a esse mesmo progresso, aos cientistas, aos intelectuais, não aos analfabetos dogmáticos miseráveis de quando e onde a santa Igreja estava no auge. A internet estava se popularizando no começo do século XXI e eu vi gente naquela época dizendo na internet que a imprensa foi criada para imprimir a Bíblia (a imprensa apareceu muito depois e a leitura da Bíblia pelo povo era proibida na época), que a Constituição dos Estados Unidos era baseada nos Dez Mandamentos, que a divisão política de Três Poderes foi baseada num verso do livro de Isaías (Is 33: 22), que as primeiras universidades foram criadas pela Igreja Católica, etc. Além da panfletagem de que ladrões, corruptos, criminosos sexuais, viciados, deprimidos e pessoas com DST's são exemplos do que acontece quando uma pessoa se afasta de Deus. Como dizia outro meme da ATEA acho que de 2014: "vamos usar a tecnologia do século XXI para divulgar nossas ideias do século XII".

E eu lembro aqui, e também para a lista que eu vou fazer logo adiante, que as coisas certas que os defensores do Cristianismo dizem não servem para provar as erradas. Aliás, eles vão juntar uma série de descobertas científicas (incluindo descobertas históricas) e vão afirmar que tudo isso prova que Deus existe e a Bíblia é a Palavra de Deus inerrante. São duas coisas diferentes, e para quem sabe disso, o efeito é o contrário do que eles pretendem: a ênfase na tese errada ou duvidosa leva à dúvida sobre as partes certas, ou o que é suspeito de ser verdade.

3) Alguns aspectos da Revolução Feudal

01) Louvação da vida rural até o começo do século XX. Quando é impraticável dizer que a vida no Feudalismo era melhor que a de hoje (e há pessoas, pouquíssimas, que dizem isso a sério), eles louvam a vida rural da primeira metade do século XX. Ou esse louvor pode acontecer porque eles mal sabem a diferença. Água limpa, ar puro, comida pura, pouco barulho, eles dizem. Quem exalta a zona rural é aposentado frustrado que cresceu lá, ou herdeiro que tem um sítio para onde vai no fim de semana e pensa que a vida no mato é aquilo. Quem viveu em área rural antes de 1990, no caso do Brasil, não tem saudade da casa sem energia elétrica com banheiro do lado de fora, dos mosquitos, dos escorpiões, das cobras, do barro, da poeira, dos poucos horários dos ônibus pra cidade no ponto a quilômetros de distância, etc.

02) Discurso anti-industrial. Se os produtos industrializados fossem o que eles dizem (corante de refrigerante causa câncer, leite de embalagem longa vida faz mal, etc.), nós não teríamos expectativa de vida de mais de 50 anos, e crescendo, em quase todo o mundo como temos hoje. No Feudalismo, as pessoas de classe alta dificilmente passavam de 40 ou 50 anos.

03) Discurso antifarmacêutico. Durante o Feudalismo, o corpo humano não era muito conhecido por dentro, porque a Santa Igreja proibia a dissecação de cadáveres. E mais ainda que o corpo humano, a Microbiologia era desconhecida. E os hospitais não eram casas de cura, eram de preparação da alma do paciente para a morte. Quando a Farmacologia nos trouxe produtos que curam ou previnem doenças, isso foi um tapa na cara do Deus daquela Igreja, porque nada na Bíblia sugere a existência de microorganismos.

04) Discurso contra os anticoncepcionais e os preservativos. A pregação contra os anticoncepcionais e contra os preservativos acrescenta ao discurso antifarmacêutico a campanha contra o sexo recreativo. A campanha inclusive rebaixa a questão da doença sexualmente transmissível de médica a teológica. Como era no Feudalismo. Tudo bem que a Revolução Industrial é boa, Abigail, mas daí você vai defender um carnaval de libertinagem entre homens e mulheres desde que eles estejam limpinhos, usando pílula anticoncepcional e camisinha e seja tudo prazeroso para ambos? Sim. Ah, antes da Revolução Industrial (e da pílula anticoncepcional), os casais tinham 10 ou 15 filhos e a população mundial não chegava a um bilhão (ou mil milhões, para os leitores lusófonos que não são brasileiros); antes da camisinha do doutor Gabriele Falloppio (1523-1562), a população mundial não chegou a 500 milhões; agora, com pílula anticoncepcional e camisinha popularizadas, já somos 8 bilhões, e você olha pra uma mulher com mais de 3 filhos quase como se ela fosse maluca.

05) Louvor à violência contra criança. O cristão, principalmente católico, tem a tendência de não conseguir lidar com alguém do seu tamanho de fora da sua tribo, principalmente alguém que não pressupõe os postulados do Cristianismo, como a existência de um deus e a divindade da Bíblia ou da Igreja Católica. Este cristão só tem um jeito de propagar as suas crenças: impô-las aos filhos e a outras crianças aos seus cuidados. Em um ambiente social cristão, este cristão pode também despejar na criança o seu fracasso pessoal e a sua ignorância. Os defensores disso alegam que essas crianças crescerão como pessoas maduras e honradas, como se negar a vida social ou tirar a vida de quem não segue o catecismo (literalmente) fosse isso.

06) Desprezo à escolaridade. Nós sabemos que o Cristianismo resistiu ao Império Romano e a elites satanistas por dois milênios, mas a fé de qualquer adolescente do interior do Terceiro Mundo não dura até o segundo ano de universidade se sobreviver ao Primeiro Grau. E eu não perco de vista, quando digo "desprezo à escolaridade", que muitos idosos de baixa escolaridade querem que os filhos tenham curso universitário. Ora, eles querem que os filhos estudem, não eles próprios, porque eles descobriram que isso pode dar acesso a um trabalho que pode dar um bom dinheiro. Trabalho dos filhos. Como não estamos mais em um país católico de economia agrária, é impraticável tirar os filhos da escola pública dizendo que esta é um ambiente de heresia, satanismo, liberação sexual e coisas assim. E houve um tempo (no Brasil, não muito pouco tempo atrás) em que isso acontecia (a associação).

07) Glorificação do analfabetismo. Não é exatamente a mesma coisa do desprezo à escolaridade que eu expliquei há pouco. A glorificação do analfabetismo é a visão de uma essência superior em ser iletrado e provinciano. O sábio, nessa linha de pensamento, é sempre analfabeto e velho (já vou entrar nessa parte do velho). Soa familiar? A própria Bíblia é distorcida para dar esse significado até hoje, essa distorção inclusive em igrejas evangélicas e protestantes, que já foram vistas, com razão, como comunidades com mais escolaridade e conhecimento bíblico que a massa católica. Alguns textos: 1Co 1: 17 a 29, 2Co 3: 6, Jó 5: 13.

08) Glorificação da pobreza. É verdade que a Revolução Francesa foi obra do que chamamos hoje de capitalistas ou burgueses, e até nisso o discurso contra a ostentação ou a ganância tem por trás um pouco dessa mágoa do passado. Mas quando ouvimos um discurso cristão, especialmente da Igreja Católica, contra o luxo, contra a ganância e contra o consumismo, o ataque é principalmente e não tão obviamente contra o progresso da humanidade na medida em que a Igreja Católica Apostólica Romana perdeu poder político, social e moral. Associar o Capitalismo ao progresso científico e social é como associar o socialismo sino-soviético à democracia, mas a revolução que nos trouxe o Capitalismo e a queda política da Igreja Católica Apostólica Romana nos trouxe um progresso que é notório no nível micro, que é a vida do pobre. Você que é do Brasil já sabe que tem confortos e recursos hoje que os seus bisavós não tinham com a sua idade. E os seus bisavós estavam melhor que os servos feudais e, em alguns aspectos, melhor que a nobreza feudal. Você já deve ter ouvido por aí, como crítica aos ricos, que "é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus" (Mt 19: 24, Mc 10: 25 e Lc 18: 25). É má interpretação? Um pouco é. Mas a explicação é principalmente essa, a mágoa porque a queda política da Igreja Católica Apostólica Romana não trouxe o fim do mundo, mais a frustração invejosa da pessoa pobre que diz isso ou está na plateia ouvindo. Ah, e agora também vemos, nessa onda, um discurso da Igreja Católica contra o Capitalismo, contra a exclusão social e contra a degradação do meio ambiente; assim, eles acrescentam uma parceria com uma campanha socialista, talvez numa esperança do Vaticano de participar da futura nova União Soviética, que vai ser o mais próximo alcançável da glória da Idade Média.

09) Vilificação da beleza e da juventude. Se você ouvir alguns pregadores cristãos, ou se eles ouvirem você, vai parecer que é pecado você gostar do que é bonito, e também ver beleza na juventude. Você deveria ver beleza, segundo eles, em gente velha, em mulheres feias, em corpos afligidos por trabalhos horríveis e por más condições de vida. Se você vir isso como um flerte para a cultura feudal, de quando uma pessoa da nobreza podia ter menos confortos que um pobre do interior do Brasil dos anos 1960, isso pode fazer sentido.

10) Vilificação da mulher agradável. Você, leitor, observa que eu não podia deixar de pensar em sexo. O assunto. Mas no sexo na Idade Média e na Idade Moderna, é melhor nem pensar muito, porque os sabonetes que conhecemos hoje são mais ou menos recentes. Talvez, no caso do Brasil, os seus avós da zona rural tomavam banho em bacia com sabão de coco. A Revolução Feudal também tem um aspecto de inveja. E quando eu disse "mulher agradável", não era um jeito elegante de dizer mulher gostosa pra c%€%£§@. Pode ser também. Mas pode ser uma mulher apenas com um corpo mais perto do mais ou menos. Ou só uma mulher bonita com corpo sem graça. Ou só uma mulher com corpo sem graça e nem tão bonita, mas de companhia agradável. Até isso pode causar inveja nas camponesas feudais de hoje. E quanto mais inveja uma camponesa feia do Feudalismo poderia ter se ela visse uma mulher agradável (para os homens) levando um homem pobre trabalhador para um lugar limpo com água e sabão?

11) Demonização do sexo. Não é só pela propaganda negativa do sexo que afaga o ego das camponesas feudais feiosas, tanto as do Feudalismo quanto as modernas. Também não é só por isso mais a conveniência de uma cultura contra o prazer que favorece a exploração do trabalho. Nós temos aqui mais uma coisa em que o Feudalismo não deixa saudades. Primeiro, é improvável você conhecer alguém que morreu de sífilis antes dos 50 anos. Isso era muito menos incomum até o século XIX. Segundo, a transmissão de doenças venéreas e a gravidez indesejada eram muito mais comuns até o século XIX, porque os métodos para evitá-las eram pouco acessíveis ou até proibidos, como a nossa conhecida camisinha (na verdade, não como a conhecemos, mas uma versão mais rudimentar). Pelo discurso conservador, parece não existir forma de uma mulher ter uma vida sexual decente por muito tempo sem ter gravidez indesejada, pegar uma doença sexualmente transmissível, se viciar em drogas ou ser vítima de violência; e sempre, desde o começo, parece não existir forma de uma mulher ter uma vida sexual decente, mesmo com um homem só, e ser uma pessoa digna. Mas o contrário, fora a parte das drogas, é mais possível do que nunca desde o fim do século XX.

12) Demonização da pornografia. A demonização da prostituição e da pornografia são resultados da demonização do sexo, mas a pornografia profissional e a amadora que conhecemos desde os anos 1960 têm mais algumas particularidades que têm a ver com a decadência católico-protestante. A primeira é existir sem pedir permissão da Igreja Católica Apostólica Romana ou da burocracia estatal, da qual uma boa parte dos funcionários são católicos ou protestantes devotos. Se a pornografia comercial começou como atividade do crime organizado, como dizem alguns puritanos, isso era tão esperado quanto, segundo eles mesmos contam, a igreja que se reunia em catacumbas do Império Romano. A segunda particularidade é ser uma das grandes aplicações do cinema, da fotografia, da imprensa (os mais velhos conheceram a revista Playboy impressa e as revistas de sexo explícito) e, desde o fim do século XX, da Informática e da Worldwide Web, mais conhecida como internet. A pornografia teve tudo isso e a fé cristã não teve nem a imprensa durante mais de um milênio (a Bíblia, que aliás é uma palavra grega no plural, era um monte de pergaminhos copiados a mão). Haveria uma certa inveja? E por falar em inveja, eles dizem que as atrizes pornôs são lindas e têm corpos exuberantes esculpidos com silicone. Como você que acessa o material inadequado sabe, isso não é a regra geral, mesmo hoje. Mas vamos supor que seja verdade. Eles pegam esse fato e, unidos com as lesbofeministas, fazem uma campanha de propaganda de que a indústria pornográfica impõe padrões de beleza irrealistas e irrealizáveis para as pobres vacas camponesas feudais, e provoca expectativas exageradas para a vida sexual dos seus infelizes maridos, futuros maridos ou futuros genros. E ainda nessa campanha de propaganda, a pornografia produz estupro, pedofilia, tráfico de mulheres adultas e adolescentes, uma das maiores fontes de renda do crime organizado e alterações no cérebro semelhantes às da cocaína. Parecia uma loucura dizer que tudo isso tem a ver com filhos de vacas provincianas que têm, ambos, saudades da Idade Média?

4) Por que a Revolução Feudal é feita por leigos?

Mas por que a defesa fervorosa da fé cristã vem de clérigos isolados ou de pessoas comuns que fantasiam a época em que os avós nasceram? Ou: se existe mesmo uma ameaça aos valores cristãos, porque o próprio Vaticano e as lideranças de outros ramos do Cristianismo não estão pelo menos falando sobre isso? Porque o Cristianismo nasceu como religião estatal romana, e se houver mesmo a formação de um governo socialista mundial, a cúpula espera ter a sua parte nele enquanto os padres e os pastores em geral, que já têm o seu salário e a sua audiência para falarem o que sempre falaram, não têm capacidade para perceber o que está acontecendo. E com uma liderança alienada e a liderança da liderança suspeita, vem uma membresia espiritualmente fria, como se diz no meio cristão. Aí, uma minoria que realmente leva a Bíblia mais a sério acaba misturando isso com trejeitos sectários mais o desprezo pela modernidade.

E por falar em rejeitar a modernidade, eu digo o que eu costumo responder a quem diz "rejeite a modernidade": rejeite a Idade Média. Um abraço hétero.

5) Eu ia encerrar aqui, mas...

Deutsche Welle, 21 de fevereiro de 2024: "Alemanha: Igrejas católicas estão sendo demolidas"[1]. Sabe o que eu acho? Eu acho é pouco. A Alemanha é um da meia dúzia de países desenvolvidos que ainda são de maioria católica. Eu sei que quem deixa de ser católico quase sempre não passa a ser ateu, mas protestante, evangélico ou até muçulmano. Mas esse fenômeno de templos católicos sendo demolidos ou virando pubs ajuda a confirmar a imagem pública do Catolicismo como uma religião de terceiro-mundista fracassado e miserável, que, aliás, foi feito pra ser; ou um resíduo insulado da pobreza socioeconômica e intelectual de antes do século XX. Um conservador vai ver esta matéria e vai dizer que com isso, a Alemanha vai ter mais violência, corrupção, progressismo, doenças psiquiátricas, bebedeiras e libertinagem sexual, se parecendo com o Brasil. Ops! O Brasil também é de maioria católica.

NOTAS E REFERÊNCIAS:

[1] "Alemanha: Igrejas católicas estão sendo demolidas". Deutsche Welle, 21 de fevereiro de 2024. https://www.dw.com/pt-br/alemanha-igrejas-cat%C3%B3licas-est%C3%A3o-sendo-demolidas-ou-readequadas/a-68308132

Texto original em português sem fotos e vídeos de putaria no A Vez das Mulheres de Verdade: "A Revolução Feudal", https://avezdasmulheres.blogspot.com/2024/02/a-revolucao-feudal.html
Texto original em português com fotos e vídeos de putaria no A Vez dos Homens que Prestam: "A Revolução Feudal", https://avezdoshomens.blogspot.com/2024/02/a-revolucao-feudal.html

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

A hipergamia feminina é a burrice dos conservadores antifeministas

Abigail Pereira Aranha

Alguns exemplos

Empauduramento

22 de setembro de 2017 às 00:07

Empauduramento. "Alô amor... tenho uma ótima notícia pra te dar... fui promovida!!" (patrão

Alô amor... tenho uma ótima notícia pra te dar... fui promovida!!

(Patrão "por trás" dela enquanto ela fala ao telefone apoiada sobre a mesa do escritório.)

Lugar de mulher é em casa, porque não é mercadoria pra estar na mesa do patrão. Mulher é propriedade, e deve servir ao seu dono corretamente.

Paulo R. Ribeiro Se parar pra pensar, elas escolheram ser propriedade dos patrões e do estado e não mais dos maridos...

Empauduramento Mulher que trabalha fora da para o patrão, sim!!!!

(https://www.facebook.com/empauduramento/photos/a.1412500628867177.1073741828.1412493812201192/1412500405533866)

Metendo a Real

01 de março de 2014 às 15:56

22 de setembro de 2017 às 00:07

Metendo a Real (www.facebook.com/ExpondoaReal). Péssimas notícias. Então sua namorada disse que neste carnaval ela vai pro acampamento da igreja. Um homem e uma mulher se beijando.

Péssimas notícias. Então sua namorada disse que neste carnaval ela vai pro acampamento da igreja.

(Um homem e uma mulher se beijando.)

(https://www.facebook.com/ExpondoaReal/photos/a.301742743298658.1073741828.301733839966215/374091939397071)

Orgulho de ser Autêntico e Original

12 de setembro de 2017 às 13:58

Orgulho de ser Autêntico e Original. O dia que acabou a confiança, a credibilidade e a fidelidade dentro dos relacionamentos foi quando criaram as redes sociais. Um homem e uma mulher na cama, o homem dormindo e a mulher digitando no celular.

Orgulho de ser Autêntico e Original. O dia que acabou a confiança, a credibilidade e a fidelidade dentro dos relacionamentos foi quando criaram as redes sociais.

(Um homem e uma mulher na cama, o homem dormindo e a mulher digitando no celular.)

Além disso, ainda temos por força da lei 11.106 de 28 de março de 2005 (início do governo do pai de todos os ladrões) a revogação do artigo 240 do CP que tratava do adultério, e que foi extirpado em decorrência do seu "desuso" nos inquéritos policiais e boletins de ocorrência.

Por isso que a internet, inclusive a ascensão das suas redes sociais e grupos fechados e secretos, se tornaram antros perfeitos para a proliferação das traições nos relacionamentos de modo geral.

#Tiger

(https://www.facebook.com/1518505138290517/photos/a.1647378082069888.1073741829.1518505138290517/1664543817019981)

Hipocrisia Da Mulher Conservadora 3

11 de agosto de 2017 às 20:40

Hipocrisia da Mulher Conservadora. Pra família e na igreja elas parecem mulheres honradas demonstrando serem comportadas, e com cara de "santas imaculadas". Mas entre elas e na vida pessoal, elas são vadias rodadas e assumidamente declaradas.

Hipocrisia da Mulher Conservadora. Pra família e na igreja elas parecem mulheres honradas demonstrando serem comportadas, e com cara de "santas imaculadas". Mas entre elas e na vida pessoal, elas são vadias rodadas e assumidamente declaradas.

Por fora bela viola, e por dentro pão bolorento.

#Tiger

(https://www.facebook.com/334267746948622/photos/a.478486312526764.1073741829.334267746948622/479190145789714)

Meus comentários

Uma legião de provincianos mal sucedidos entrou no Movimento da Real, nos MGTOW e outros grupos semelhantes, e entraram com eles dois problemas graves. O primeiro é a ideia de que combater o LGBT-Feminismo é o mesmo que defender o Conservadorismo. Ou, pior ainda, a ideia de fazer o antifeminismo como salvação do fundamentalismo católico-protestante do interior. O segundo é a mesma mistura de insanidade e burrice produzida pelo esquerdismo na sociedade em geral entrar no que devia ser uma resistência a ele. Esses memes mostram a mesma confusão que já existe na esquerda militante e na vida nacional, por exemplo, do Brasil: a confusão entre fazer uma representação ou um discurso da própria visão de mundo e fazer uma descrição objetiva da realidade.

A esquerda já teve cartunistas que conseguiam dizer verdades do mundo real com piadas, até usando o exagero, mas um exagero que servia para chamar a atenção e conseguia. Quando a esquerda se degenerou, alguns humoristas com pensamento de direita até ganharam espaço, mas mesmo para os bons, como diz a chamada do programa "Zorra" da Rede Globo, "está difícil competir com a realidade". O pensamento esquerdista ganhou tanto espaço na cultura, nos costumes e na política que o que seria ridículo 20 anos antes pode ser, quando muito, uma curiosidade exótica, desde que tenha o pensamento de esquerda como fundo. Já imaginaram se na década de 1980, alguém fizesse uma obra de humorismo mostrando um futuro próximo em que professores esquerdistas fariam protestos escrevendo faixas com erro de ortografia? Ou em que uma mulher feminista participaria de uma corrida de rua sem absorvente no período menstrual? Ou em que mulheres feministas protestariam contra o estupro fazendo uma passeata seminuas nos centros de várias grandes cidades do mundo? Trinta anos atrás, não seria qualquer inimigo declarado do Feminismo que faria uma piada dessas, ou riria de uma. Hoje, isso não é piada, é notícia nos maiores veículos de notícias do país e do mundo. E os esquerdistas parecem não se dar conta dos absurdos que eles dizem e fazem, mas os antiesquerdistas tentam ridicularizar os esquerdistas com o mesmo estilo que eles usam. Os conservadores parecem esquerdistas com clichês trocados. Por isso, mesmo quando os movimentos esquerdistas ganham descrédito entre o povo de verdade, o pensamento de direita conservadora se parece menos com restaurar uma inteligência antiga do que com reciclar idiotices velhas.

E uma das burrices comuns de homens conservadores é o que eles chamam de hipergamia feminina. É a tese de que todas as mulheres em idade fértil dessa geração estão liberando tudo para os homens mais destacados. No mínimo, para qualquer homem em melhor condições financeiras ou mais cafajeste que encontrem. Segundo a tese, toda mulher é uma devassa em potencial, mas isso não era visível no tempo dos avós deles porque as mulheres eram casadas jovens e eram vigiadas pela sociedade da época. A tese é tão interiorana que ignora a descoberta já formalizada de que, na regra geral, o interesse feminino em sexo é muito menor que o do homem.

Uma mulher LGBT-feminista não saberia explicar como ela consegue sair de casa e voltar ilesa em um país onde todos os homens são ensinados que podem estuprar e agredir mulheres, e onde a sociedade, quando pouco, tolera crimes contra mulheres. Um rapaz conservador não saberia explicar como ele foi rejeitado por todas as mulheres que encontrou e ele era virgem aos 22 anos em um país onde todas as mulheres em idade fértil são promíscuas. Um esquerdista quer acabar com os assassinatos por homofobia censurando postagens inocentes em redes sociais. Um conservador antifeminista quer salvar a família tradicional proibindo anúncios com mulheres de biquíni. Uma mulher feminista vê machismo em homens companheiros de ativismo. Um conservador antifeminista católico vê satanismo em evangélicos. A grande diferença é que quando a extrema-esquerda diz absurdos, pelo menos consegue resultados, eles são loucos mas não são burros; o fundamentalismo sertanejo só consegue perder credibilidade e público, além de dar munição para a esquerda mais ajuizada. Mas ambos conseguem fazer desenhos ou montagens fotográficas como se aquilo que eles dizem descrevesse o mundo real.

Se você gostaria de mostrar algo ridículo do seu inimigo, você conseguiria fazer isso usando material feito por ele mesmo com poucos complementos? Você consegue refutar o inimigo, talvez com humor, no território dele? Você consegue ter um comentário seu na página do inimigo, ou no perfil dele em rede social, que ele tem de apagar o comentário ou a página de vergonha? Eu pergunto isso porque a onda agora é proteger a família dos ataques do Diabo no culto de domingo. Ou combater a extrema-direita em encontros de esquerdistas e ficar em estado de alerta porque descobriram dois centristas no evento. Ou combater o Feminismo da grande mídia em grupo secreto no Facebook.

Eu tenho 26 anos e estou na vida de licenciosidade desde os 14, já transei com 281 rapazes. O meu blogue em português em que eu compartilho pornografia e até um pouco das minhas peripécias é acessado basicamente por homens. As mulheres que foram lá nos comentários eram quase todas feministas, e foram só pra me encher o saco. Os meus amigos e seguidores nas redes sociais são quase todos homens. No bate-papo do Facebook, eu já tive amigos dizendo que, digamos, pensam em mim com carinho, e tenho um que me conta sobre o tratamento dele para ejaculação precoce. Mas nenhuma mulher veio conversar comigo sobre sexo, a não ser algumas das poucas que não são conservadoras dizendo que gostariam de me lamber. No mundo físico, não é muito diferente, só não tenho as garotas bissexuais interessadas em mim. Eu não vou para festas liberais, nem para aqueles lugares onde dizem que há muita putaria (sério, eu prefiro estar com amigos em casa mesmo, a casa deles ou a minha). E nenhuma mulher me convida pra ir, nem as que foram lá no último fim de semana comentam comigo sobre como foi. Nenhuma das mulheres "comuns" me visita em casa ou me acompanha nos encontros com as minhas amizades masculinas. Não é que elas não façam loucuras sexuais, mas o que elas fazem é esporádico e quase sempre com trastes, sob efeito de bebida, para conseguir dinheiro ou para atingir os pais ou o marido.

Essa ideia de as mulheres têm uma libido exagerada e precisam ser vigiadas para não fazer sexo antes do casamento ou fora do casamento depois de casadas, essa ideia é medieval, é provinciana, é um eco atrapalhado da fofoca das interioranas repulsivas que tinham inveja das moças bonitas da cidade nos anos 1920. É curioso que nenhum homem que fale de hipergamia feminina se lembre dessas interioranas. Os conservadores reacionários já teriam um problema se isso fosse verdade: por que a heterossexualidade masculina pode ser no mínimo aceita e a heterossexualidade feminina precisa ser reprimida? Qualquer feminista moderada pode dar uma resposta fantástica, e algumas já deram. Mas, para piorar, isso é mentira e eu dou o meu próprio exemplo para provar. Como um homem moralista conservador não consegue admitir para si mesmo a própria sexualidade insatisfeita e a incoerência de suas ideias conservadoras, ele projeta nas mulheres com quem ele gostaria de transar o estilo de vida que ele gostaria de ter.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

TETESUDA: eu Transei, Filmei, Gostei, Assumi e Espalhei (um romance de Abigail P. Aranha)

UM ROMANCE DE

Abigail Pereira Aranha

CAPÍTULO 1

Olá, meus amigos e minh@s inimig@s. Vocês devem ter visto o meu vídeo fazendo sexo com três rapazes que deu o que falar oito meses atrás. O meu nome é Maria Tereza, tenho 22 anos, fui criada em Santa Cruz do Escalvado, estado de Minas Gerais, moro em Sabará, região metropolitana de Belo Horizonte, sou formada em Ciência da Computação pela Universidade Federal de Minas Gerais.

O vídeo é de seis anos atrás, um dos rapazes era meu namorado na época. Ele tinha 16 anos também, ele é três meses mais velho que eu. Ele é lindo por dentro e por fora, muito carinhoso, muito ético, trabalhava duro num supermercado na nossa cidadezinha, estudava à noite. Os pais dele eram evangélicos de uma igrejinha tosca, faziam muita vigilância quanto a sexo antes do casamento. Um dia, eu combinei com ele de a gente se encontrar escondido numa folga dele, a gente conseguiu furar a vigilância dos pais dele e a dos meus (outros carolas dos infernos), nos encontramos e fomos para um matagal perder as nossas virgindades. Alguns meses depois, nós dois estávamos com um casal de namorados amigos nossos e eu fiz uma proposta de troca de casais com eles. De brincadeira. O meu namorado achou estranho, mas eu disse pra ele que eu tinha de dar algum motivo para ele estar comigo além do monopólio do prazer da carne. A minha amiga me olhou com aquela cara de você-está-achando-que-eu-sou-o-quê, mas parece que concordou com o meu argumento. Um dia, nos encontramos para a safadeza. E eu ainda coloquei no negócio um amigo meu, colega de sala no 2º ano do Ensino Médio que era o melhor aluno da sala e também excelente pessoa. Negócio, mas não houve dinheiro envolvido, hehehehe.

Fizemos a safadeza e gravamos com a câmera digital do irmão desse meu amigo solteiro, e até então virgem. E também foi tudo na casa dele. Os quatro estavam mascarados, só eu de cara limpa. E o que foi gravado foi só a minha parte, eu, o meu namorado e os dois amigos, e quem gravou foi a minha amiguinha de infância, o namorado dela comendo o meu cu. Depois, o meu namorado transou com ela, os dois achando esquisito, ele com outra garota, ela com outro rapaz. Eu dei bronca (de brincadeira):

- Poxa, gente, está certo que eu fui pornográfica, mas não fiquem com tanta vergonha. Estão parecendo o meu pai e a minha mãe. Mais entusiasmo, gente! Querem ver um vídeo pornô que eu copiei no meu celular?

Então, eles riram e se animaram um pouco mais.

CAPÍTULO 2

Pois bem! Então, um babaquinha de Santa Cruz do Escalvado descobriu uma cópia. Ele descobriu meu celular, propôs transar comigo, eu já o conhecia, nunca gostei dele, recusei. Aí, ele disse que viu o vídeo e ameaçou publicar na internet. Eu havia começado a trabalhar dois meses antes na prefeitura de Sabará. Então, eu chorei, perguntei o que ele queria, ele pediu dinheiro, eu combinei de deixar para ele em um envelope no banheiro masculino de um bar que ele frequentava no sábado seguinte (aquele dia era quarta-feira). No dia, preparei o envelope, fui lá uns dez minutos antes dele, deixei o envelope no banheiro, saí rápido. Então, ele chegou com dois amigos e viu o envelope lá, "Para o..." (nome dele), abriu lá mesmo. Só que em vez do dinheiro que ele pediu, o que estava lá era uma revista de bolso de sexo gay. E um dos amigos do cara ainda chegou por trás dele (no sentido de estar indo para lá no mesmo minuto) e viu a revista. O cara já estava puto e ainda ficou com vergonha. Porque eu já coloquei a revista no envelope com o plástico rasgado (como ele ia explicar que não abriu?). E eu olhando do lado de fora, escondida, saí correndo rindo pra caramba. Ah, o choro do outro dia era fingido, eu já estava arquitetando tudo. Prevendo inclusive que ele publicasse a nossa produção cinematográfica, como publicou.

Mas quando eu estava saindo de lá, me lembrei dos quatro amigos. Mandei uma mensagem: "Vamos fazer sucesso na internet, gente! Preparem a cara de surpresa, eu vou pegar os três anos de cadeia por casa de prostituição sozinha [éramos todos menores na época e o menor no Brasil não pode ficar preso por mais de três anos; na época, manter casa de prostituição era crime]". O meu ex-namorado estava no trabalho, então a noiva dele não viu a mensagem. O casal de amigos já era casado e tinha uma filha pequena (a filha não é do meu ex-namorado, hehehehe), eles ficaram com vergonha (eles continuam evangélicos). O amigo solteiro estava em casa com a família, mas tinha ido para o quintal sozinho logo antes. E o bom é que além de estarem todos mascarados menos eu, só eu estava mais ou menos com o mesmo corpo. Os rapazes eram magros, hoje estão mais robustos. A moça minha amiga era magra, engordou um pouco. Eu me desenvolvi um pouco cedo, já tinha as minhas tetas de vaca leiteira e a minha bunda redondinha. Então, como no vídeo, as picas vão vir todas em cima de mim.

Fui visitar primeiro o meu ex-namorado. Nós terminamos o namoro ainda quando eu morava na cidade, porque a mãe dele me achava muito pecadora para o filho dela e fez pressão para a gente acabar. Mas continuamos a ter contato via celular e rede social. Fui ao trabalho dele, porque ele está noivo e a noiva dele além de ser uma evangélica muito tosca, não gosta de mim. Por isso eu tive que me comportar como uma amiga normal. Encontrei uns amigos, fui chamada para um lanche, aceitei.

CAPÍTULO 3

Eu toquei a campainha do portão da casa da minha família umas duas horas depois de ter deixado aquele pacote para o cafinha, a minha mãe já grita da porta:

- Que estória é essa de um vídeo seu com um homem na internet?

Poxa, mãe, você nem viu e ainda ouviu por aí errado, eram três. Ela nem me recebeu. Aí, eu fiquei ouvindo a três metros de distância que eu era prostituta, que eu me rebaixei como pessoa e como mulher, que eu não tenho moral, que eu envergonhava a família, só faltou me chamar de feminista e torcedora do Atlético Mineiro. Saí de lá me preparando para pegar o último ônibus para Ponte Nova: 12:00. A minha mãe disse que o meu pai estava indignado comigo, mas ele me ligou depois, disse que tinha vergonha de mim, mas foi mais brando que a minha mãe, o máximo que ele me xingou foi "devassa".

Mas antes de sair da cidade, fui a uma padaria tomar um café, antes eu troquei de roupa e estava com um vestido tomara-que-caia (se o leitor não é do Brasil e não conhece, tomara-que-caia é um vestido ou uma camisola feminina sem alças que vai até pouco acima dos seios). A única pessoa que não me olhou torto foi um rapaz de 16 anos, mas ele ficou constrangido para conversar comigo ali. Não sei como, eu previ que ia encontrar alguém nessa situação, já cheguei na cidade com uns papeizinhos impressos com meu nome e o meu perfil no Facebook. Como ele era o balconista, entreguei a ele um desses papeizinhos discretamente junto com a ficha do caixa. Ah, e ele era o único homem presente. Ele é um rapaz muito gentil, mas as mulheres colegas dele estavam querendo que ele se livrasse de mim rápido (ou elas queriam se livrar de mim). Nunca tinha visto antes: um estabelecimento comercial se esforçando para atender mal um cliente. Mas quando saí, cheguei na calçada (uma daquelas porcarias que não têm um metro e meio de largura), o rapaz estava olhando pra mim, mostrei os meus melões brancos com azeitonas pretas no meio. E ainda, tinha me encostado em um poste (na calçada estreita), levantei a perna esquerda, e o vestido tomara-que-caia também era tomara-que-suba, era curto e daqueles que vai subindo em baixo enquanto a moça caminha e ela tem que parar de vez em quando para abaixar de novo. Mas ninguém viu a minha calcinha, só a minha periquita cabeluda mesmo. As imitações de travesti que estavam lá ficaram sem reação. Ainda faltavam uns vinte minutos para o ônibus Santa Cruz do Escalvado – Ponte Nova sair, fui para um ponto mais longe. No caminho, encontrei alguns novos fãs e deixei alguns dos papeizinhos com o meu endereço no Facebook.

Depois, no mesmo dia, o rapaz da padaria (vou chamá-lo de Agostinho) me mandou uma mensagem privada pelo Facebook dizendo que viu o vídeo, que nenhuma mulher é pior porque faz sexo com gosto, além de dizer que eu sou linda e muito simpática. E me agradeceu porque eu lavei a alma dele mostrando os peitos no meio daquelas tribufus (para quem não é do Brasil, é uma gíria para mulher feia) e ainda deixei uma lembrança pra ele. É que eu já coloquei o tomara-que-caia pra isso mesmo, mas não esperava fazer a travessura tão rápido. E quando eu vi o rapaz ser tão simpático, fiz uma proposta: "você quer tirar uma foto minha aqui para guardar de lembrança?". Eu estava na mesa, posei para uma foto (discretamente). Eu estava saindo, ele tirou mais uma. A terceira foi a foto contra a família (ele foi pego de surpresa). A quarta me mostra começando a sair de lá e as tribufus horrorizadas. Ele me mandou todas na mensagem privada. Eu quase chorei de vergonha: como uma moça mostrando um pouco de simpatia e de coragem e que tem mais moral além de pregar a pica mole virou uma coisa extraterrestre! Eu agradeci, disse a ele que ele era gatinho, que ele já me parecia uma pessoa excelente à primeira vista, pedi para ele manter contato e o chamei para uma visita quando estivesse por perto para ver tudo que viu mais de perto.

CAPÍTULO 4

No dia seguinte, domingo, a notícia se espalhou por Sabará. Fui mais amada pelos amigos, mais odiada pelos inimigos e pelas inimigas e mais conhecida por desconhecidos ou pessoas sem muito contato comigo que entraram em um dos grupos anteriores, quase sempre o segundo. Fui ver isto melhor na segunda-feira, começando mais uma semana de trabalho. A divisão da prefeitura de Sabará onde eu estava já era um lixo para trabalhar mesmo, mal entrei e já estava procurando outra coisa. E além das macacas lésbicas com os inferninhos de sempre, elas conseguiram inventar mais mentiras sobre a minha qualidade de trabalho do que sobre a minha qualidade sexual. Acabei saindo de lá duas semanas depois. Você conhece a região da rua Guaicurus, em Belo Horizonte, onde ficam os prostíbulos mais conhecidos da cidade? Pois é, fui trabalhar naquele pedaço, numa loja de assistência técnica de notebooks em um shopping popular. Ah, eu também tenho curso de técnico em Eletrônica.

Eu sou a única mulher na loja, entrei no lugar de outra mulher que os colegas diziam que não era muito simpática. No primeiro dia de trabalho, eu cheguei dizendo: "Bom dia, amigos! Sou essa mesma que vocês estão pensando. Agora, estamos juntos profissionalmente". E eu levava uma caixa com rosquinhas de leite condensado que eu preparei no dia anterior. Então eu disse para os meus dois colegas e um cliente que chegou logo depois: "no meu primeiro dia, eu ofereço a minha rosquinha para vocês comerem". Gente, eu juro que saiu sem malícia e sem duplo sentido, mas eles riram pra caramba, depois eu me dei conta (explicando para quem não é do Brasil, "comer a rosquinha" pode ser fazer sexo anal). E eles comeram e gostaram, me deu muito gosto de ver os rapazes acabando com a minha rosquinha (de leite condensado). Então, estou na empresa há seis meses, a empresa cresceu, eu visito os três endereços (antes era só uma loja), os colegas e clientes gostam muito de mim e eu deles (porque os clientes que não me viram com simpatia caíram fora, hehehehe).

Ah, e eu criei um blogue pessoal no meu segundo mês na empresa: Tetesuda Tetê de Luz. Eu tinha o apelido de Tetê na minha cidade de origem e um amigo meu de lá fez o trocadilho com "tesuda" na época do escândalo sexual. As inimigas fizeram o trocadilho com "tê de luz" (aquela peça pra ligar três aparelhos elétricos na mesma tomada). Eu escrevo lá principalmente sobre coisas do cotidiano, literatura, vida universitária, Computação e sexualidade. Ops, sexualidade é coisa de velhota metida a soltinha, o meu negócio é putaria! A minha primeira postagem foi o vídeo famoso. A segunda e a terceira, logo em seguida, foram sobre dois casos da babaquice universitária. A quarta, logo em seguida, foi sobre bons hábitos de saúde.

Na mesma época, e eu também resolvi pegar uma renda extra na rua Guaicurus. Avisei os amigos onde eu atendia. Até hoje vieram 16 amigos de Sabará, 2 colegas do trabalho, 5 amigos de Santa Cruz do Escalvado e o irmão da esposa de um desses amigos de Santa Cruz do Escalvado porque ela viu a mensagem e mandou o cara pra vigiar o marido dela em Belo Horizonte. Ah, e o Agostinho foi me ver também. Ele chegou, eu estava na escada, eu o chamei, o porteiro não pediu a identidade dele (combinamos tudo por celular). Tirei a virgindade dele. Mas vocês não vão acreditar: eu tinha colegas faltando me chamar de prostituta, porque eu fazia o trabalho por gosto e não por estar no fundo do poço. E as minhas colegas todas eram feias, muito magras, gordas, viciadas em drogas ou desempregadas, quase todas elas mostravam que não gostavam do que faziam. Eu conquistei os clientes e eles só não faziam fila pra mim porque não tinham coragem de ficar um na frente do outro. Só fiquei lá dois meses, mas atendo os clientes bons até hoje. Alguns eu já atendi na loja, eu disse que consertava notebooks e quando eles precisaram do serviço, me procuraram (para consertar o notebook com defeito) e saíram com mais uma coisa para me elogiar.

Na mesma época, eu sugeri ao meu patrão que a gente fizesse um jornal pequeno com alguns textos, entre eles alguns meus, como publicidade nossa, e ele aceitou. Aí fomos ganhando mais clientes, a empresa cresceu, o meu salário cresceu, a minha cota na empresa cresceu, o número de fãs da Tetê de Luz cresceu, a admiração de quem já era fã cresceu, e sei que eu fiz muita coisa por aí crescer e ninguém estava vendo.

CAPÍTULO 5

Mas eu também tive uns dissabores, e com isso eu notei algumas coisas. Vou tomar nota de algumas coisas que eu fui pensando nessa turbulência toda:

01) Quem deu o alarde primeiro e me condenou mais foram as vadias e cafajestes. Em segundo lugar, vieram as "ex-vadias", as "maduras" anorgásmicas e os "senhores" legalistas com cada vez mais frustrações e menos sexo. Bom, juntando todos é quase todo o povo, mas ainda há sociedade além disso, né?

02) Quando se diz que a vida de uma mulher foi destruída por causa de um "vídeo íntimo" publicado na internet, são três ideias por trás: difamar a heterossexualidade e censurar a internet.

03) A terceira ideia (ahá!) é reforçar a arbitrariedade de vadias e lésbicas. Já imaginou um ladrão assaltar uma loja com vigilância por câmera e, depois de preso, processar o estabelecimento por danos morais? Pior: imaginou o juiz condenando mesmo o estabelecimento? Se um vídeo meu, sou eu mesma lá literalmente à vontade, é excluído da internet porque eu abri um processo judicial dizendo que aquilo fere a minha honra (ainda volto a esse ponto), o que mais eu posso riscar do mapa? Um comentário no Facebook dizendo como eu atendo mal os clientes da empresa onde eu trabalho? Eu posso publicar que homem que vê pornografia é infantil, que homem que procura prostituta é incompetente, que mulher que publica foto de biquíni é vulgar, que quem lê uma página de direita é débil mental, mas quem publicar dez palavras que me desagradem vai ser obrigado a apagar?

04) Se eu tivesse dito que fui traída, chorando de verdade, talvez me suicidado, eu teria tido dezenas de feministas dizendo que eu fui vítima do patriarcado. Mas como eu levei na boa, nenhuma palavra deles. Ops, me esqueci: uma feminista bissexual disse que eu estava zombando das meninas que foram destruídas pelo machismo. E foi dizer isso justo no meu blogue.

05) Quem disse que eu posso ter a vida sexual que eu quiser são os que mais falam mal de mim, e depois de muito falar mal de mim.

06) Quem assinou a minha demissão a bem do serviço público por causa de um vídeo íntimo de seis anos antes foi um secretário indiciado por enriquecimento ilícito e fraude em licitação na mesma época, e só não está preso porque o juiz ignorou as provas. Por que um mau atendente pode continuar na loja, um corrupto pode ser policial, um assassino pode ser deputado, mas uma mulher com um registro sexual fora do local de trabalho prejudica a imagem do empregador dela? Nas próximas eleições municipais, eu vou me candidatar a vereadora e já tenho o meu slogan: "Vote Tetesuda Tetê de Luz, porque é melhor fazer dupla penetração do que corrupção".

07) Aquelas fotos que o meu amiguinho novo tinha, eu disse para ele "vou colocar no meu perfil e você pode compartilhar também". Ele comentou depois que quando ele mostrou as fotos para um amigo dele, ele teve mais preocupação que três caras que ele viu no mesmo dia fumando maconha dentro de um ônibus (coletivo) em Ponte Nova.

08) Ainda há quatro anos atrás, eu lia casos de mulher que perdia emprego porque fez material erótico ou pornográfico comercial. Ultimamente, eu vejo a mesma coisa com "vídeo íntimo" ou "foto íntima". Por quê? Só atriz pornô mete e pode mostrar? Daqui a pouco vamos voltar àquele tempo em que mulher grávida escondia a gravidez e dizia que os bebês eram entregues pelas cegonhas.

09) Então divulgar um vídeo meu ou uma foto minha de nudez ou sexo fere a minha honra e viola a minha intimidade? Se eu estiver em um almoço em família e alguém tirar uma foto minha comendo macarronada como uma morta de fome com o queixo vermelho de molho e publicar no Facebook, vão ser uns 100 comentários de gente achando graça, e talvez eu mesma vou rir. Por que quando alguém vê as minhas coxas descobertas tem que ser esse drama?

10) Então cada mulher em um vídeo de sexo amador ou um material pornográfico é uma pessoa humana, com pai, com irmão, com sonhos, com uma dignidade humana? Não diga! Quem disse que sexo hétero é desrespeito ao corpo da mulher?

11) Então uma mulher em um vídeo de sexo amador ou um material pornográfico, ou mesmo usando biquíni em uma propaganda, se banaliza? O que vai me fazer uma mulher especial? Nenhum homem (ou só um) conhecer o meu umbigo? Achar que a minha dignidade e a pica de um homem que me vê estão em uma gangorra, uma sobe e a outra desce?

12) Já vi ninfetas que se casaram por interesse com velhos terem apoio da família. Por que quando eu apareço num vídeo fazendo sexo, a minha mãe me odeia? É melhor ser canalha por trás da cortina do que fazer coisas boas com todo mundo me vendo na internet?

13) Quem fala em mulheres vítimas da indústria pornográfica ou da prostituição, ou da exposição da "intimidade" na internet, não deixaria uma dessas "vítimas" ser professora do filho dele no 1º grau. Quem acha mesmo que o sexo não é sujo não acha que mulher que fez filme pornô não pode ser professora.

14) Por que todas as minhas qualidades intelectuais, profissionais e morais desaparecem quando alguém descobre que eu sou prostituta, fiz um filme pornô ou só gosto mais de sexo do que a mãe de quem fala? Se é estereótipo machista, por que nenhuma feminista descobriu uma atriz pornô com diploma universitário ou uma prostituta com uma conversa inteligente? Por que nenhuma professora, política ou filósofa feminista deu a entender que já tocou em um homem na vida, com exceção do marido? Eu tenho de escolher entre falta de pica e falta de qualidades?

15) Vários homens já me disseram pessoalmente, no meu perfil no Facebook e no meu blogue que eu sou bonita, gosto de sexo e sou simpática; que eu sou bonita, gosto de sexo e sou inteligente; que eu sou bonita, gosto de sexo e tenho um grande caráter. As mulheres já me disseram que eu sou muito bonita e bem graduada para ir atrás de homem; ou que respeitam as minhas ideias e as minhas putarias (elas só respeitam), mas admiram a minha força interior e a minha inteligência; ou só me ofenderam mesmo.

16) É honroso para mim que ninguém consiga me imaginar chupando uma rola?

Agora vou dormir pra pegar o expediente amanhã. Como estes dias estão quentes, vou dormir pelada num colchão no chão da sala. Hoje, estou na casa de um ex-colega meu da UFMG que já está lá me esperando. Vou tirar uma foto para postar no Facebook com as devidas faixas pretas na cara dele e nas minhas tetas de vaca leiteira.

Questo testo in italiano senza fumetti di libertinaggio in Men of Worth Newspaper / Concrete Paradise: TETESUDA: io Ho Fatto Sesso, Ho Filmato, Mi è Piaciuto, Ho Assunto e Ho Propagato (un romanzo da Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blog.com/2014/10/31/tetesuda-romanzo
Questo testo in italiano con fumetti di libertinaggio in Periódico de Los Hombres de Valía / Paraíso Tangible: TETESUDA: io Ho Fatto Sesso, Ho Filmato, Mi è Piaciuto, Ho Assunto e Ho Propagato (un romanzo da Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blogspot.com/2014/10/tetesuda-io-ho-fatto-sesso-ho-filmato.html
Eso texto en español sin dibujos de putaría en Men of Worth Newspaper / Concrete Paradise: TETESUDA: yo Tuve Relaciones Sexuales, Filmé, me Gustó, yo Asumí y Propagué (una novela de Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blog.com/2014/10/31/tetesuda-novela
Eso texto en español con dibujos de putaría en Periódico de Los Hombres de Valía / Paraíso Tangible: TETESUDA: yo Tuve Relaciones Sexuales, Filmé, me Gustó, yo Asumí y Propagué (una novela de Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blogspot.com/2014/10/tetesuda-yo-tuve-relaciones-sexuales.html
This text in English without debauchery cartoons at Men of Worth Newspaper / Concrete Paradise: TETESUDA: I Had Sex, I Filmed, I Liked it, I Assumed and I Spread (a novel by Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blog.com/2014/10/25/tetesuda-novel
This text in English with debauchery cartoons at Periódico de Los Hombres de Valía / Paraíso Tangible: TETESUDA: I Had Sex, I Filmed, I Liked it, I Assumed and I Spread (a novel by Abigail P. Aranha), http://avezdoshomens2.blogspot.com/2014/10/tetesuda-i-had-sex-i-shot-i-liked-it-i.html
Texto original em português sem desenhos de putaria no A Vez das Mulheres de Verdade: TETESUDA: eu Transei, Filmei, Gostei, Assumi e Espalhei, http://avezdasmulheres.blog.com/2014/10/06/tetesuda
Texto original em português com desenhos de putaria no A Vez dos Homens que Prestam: TETESUDA: eu Transei, Filmei, Gostei, Assumi e Espalhei, http://avezdoshomens.blogspot.com.br/2014/10/tetesuda-eu-transei-filmei-gostei.html

Apêndice

Após fotos íntimas pararem na web, mulher diz sofrer preconceito diário

Caso ocorreu em Maringá, do Paraná, em 2005; ex-noivo publicou fotos.

Rose Leonel criou um projeto de lei para defender vítimas do mesmo crime.

Adriana Justi

Do G1 PR

Rose Leonel ganhou a causa na Justiça em 2010 (Foto: Jackson Yonegura / Arquivo pessoal)

Rose Leonel ganhou a causa na Justiça em 2010

(Foto: Jackson Yonegura / Arquivo pessoal)

Quase oito anos após ter fotos íntimas divulgadas pelo ex-noivo na internet, a jornalista Rose Leonel, que mora em Maringá, no norte do Paraná, afirma que sofre preconceito constantemente. “Muitas pessoas, tanto homens quanto mulheres, ainda me recriminam pelo que aconteceu, infelizmente", declarou. O caso ocorreu no fim de 2005, logo após o fim do relacionamento do casal. De acordo com a jornalista, o ex-companheiro não aceitou o fim do noivado e, além de divulgar as imagens ainda insinuou em redes sociais que ela era uma garota de programa. A desavença foi parar na Justiça.

Em 2010, Rose teve a causa ganha. Contudo, ainda não foi indenizada. Leonel não aceitou o valor arbitrado, de R$ 30 mil, e tenta recusos para aumentar a quantia.

Ao G1, o advogado Thomaz Jefferson Carvalho, afirmou que atitude do ex-noivo configura crime de injúria e difamação e o valor imposto não é compatível. "Dentro disso, ela sofreu vários transtornos. Entre eles perdeu dois empregos e foi julgada pela sociedade em geral", relata. O advogado disse que aguarda uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o caso.

“Apesar de não ter recebido nenhum centavo ainda, quando a sentença saiu, eu me senti aliviada”, conta a jornalista. “Foi um alívio moral (...) como se eu tivesse recebido uma absolvição social. Depois da sentença, eu acho que ficou claro para a sociedade que eu era a vítima e ele [o ex-noivo] era o culpado da situação”, completa Rose.

Ela também não concorda com o valor arbitrado pela Justiça. "Além de ser vergonhoso, moralmente falando, perdi muita coisa. Fico me perguntando quanto vale a vida de um ser humano. Será que é só isso?”, indaga Leonel. “Não acho justo e muito menos digno de recuperar o que eu passei e passo até hoje”. “Minha vida ficou marcada por esse crime. Fui assassinada moralmente”.

Rose relembrou sobre o fim do relacionamento. “Depois de quase quatro anos de namoro, percebi que ele não se dava bem com os meus dois filhos e que um possível casamento não daria certo. Aí resolvi terminar de vez. Ele ficou totalmente transtornado e me ameaçava por telefone quase todos os dias”, relata.

O advogado do ex-noivo da jornalista, Israel Batista de Moura, relatou que o cliente é inocente. “Nós ainda não consideramos esse caso como encerrado. As denúncias feitas são totalmente nulas e inválidas. Já constatamos que o perito errou muito e não tem habilidade técnica para entender sobre o assunto”.

Leonel contou ainda que descobriu a intenção do ex em publicar as fotos através do e-mail dele. "Como eu ainda tinha a senha dele, acessava o e-mail quase todos os dias só pra ver como ele estava. Em um desses acessos descobri uma negociação com um técnico de informática, onde ele perguntava como deveria proceder para publicar fotos minhas e quanto custava. Depois de 15 dias de negociação, ele pagou R$ 1 mil em aparelhos, que facilitariam a publicação das fotos", argumenta. Foi a partir daí que a jovem decidiu denunciar o rapaz.

“Além de publicar as imagens, ele divulgou o telefone da minha casa, do meu trabalho e o celular do meu filho”, lembra a jornalista.

Projeto "Maria da Penha Virtual"

Na tentativa de ajudar outras vítimas do mesmo crime, Rose criou, em maio deste ano, o projeto de lei “Maria da Penha Virtual”. O estudo foi considerado inconstitucional pela Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e atualmente tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília, sob a defesa do deputado federal João Arruda (PMDB). O projeto já passou por duas audiências públicas e não há data para votação.

"Nós nos baseamos em torno da Lei Maria da Penha, que configura o crime de violência doméstica, mas hoje atinge a internet. O crime na internet fica gravado (...), arquivado. São casos em que, como o da Rose, ex-companheiros utilizam a rede para se vingar. E isso pode ser considerado um crime tão brutal quanto uma agressão física, por exemplo", argumenta Arruda. "Então, a nossa intenção com o projeto é ampliar a Lei Maria da Penha e, talvez, criar penas mais rigorosas", acrescenta.

“Eu quero, através desse projeto, passar uma experiência para as outras vítimas que é preciso superar as dificuldades e voltar a viver. Vou levar isso como uma bandeira e como uma missão”, aponta Leonel. “Ainda estou recomeçando. Tento reaprender a cada dia como me portar em sociedade, a recuperar a auto-estima e, acima de tudo, a viver. É um processo longo, eu não posso afirmar que já consegui. Mas, graças a Deus, tenho conseguido superar a cada dia. É um exercício constante que exige muita paciência”, completa.

Jornalista afirma que o preconceito é diário (Foto: Divulgação / Agência Estado)

Jornalista afirma que o preconceito é diário (Foto: Divulgação / Agência Estado)

Em abril de 2013 entrou em vigor a lei “Carolina Dieckmann”, que, entre outras coisas, torna crime a invasão de aparelhos eletrônicos para obtenção de dados particulares. Sancionada em dezembro de 2012, a alteração do Código Penal foi apelidada com o nome da atriz, após fotos em que Carolina Dieckmann aparecia nua terem sido divulgadas na internet.

A diferença entre os dois crimes, segundo Arruda, é que o caso de Rose é voltado apenas para mulheres. "Os dois são bem diferentes. O Carolina Dieckmann, é voltado não só contra mulheres, envolve rackers (...), entre outros. Já o da Maria da Penha Virtual trata de crimes somente contra mulheres", explica o deputado.

Vida 'marcada'

A jornalista acrescenta que teve a vida “marcada pelo crime”. “Eu vou ficar marcada para o resto da minha vida. Eu vou ter que conviver com isso. Fui vítima de um crime na internet e isso, infelizmente, querendo ou não, faz parte da minha identidade”.

A maior parte das pessoas acha que pelo simples fato de eu ter sido exposta, que eu sou culpada. Muitas, ainda, não querem nem saber do expositor, do criminoso. Com certeza, fui e ainda sou a maior prejudicada nessa história”, declara.

Na época do resultado da sentença, o perito digital Wanderson Castilho disse que a abrangência com o nome de Rose na internet chegou a sete milhões e quinhentos mil links relacionados. Quando eu entrei na parte de mensagens instantâneas, era um pedido para adicionar a cada três segundos, sem contar que ela recebia pelo menos 500 ligações por dia", relatou.

“Apesar de tudo, acho que ao longo dos anos, o preconceito foi diminuindo. Mas ainda recebo e-mails diariamente me alertando sobre as fotos e sobre o que aconteceu. Como esse tipo de crime passou a acontecer com mais frequência, acho que as pessoas passaram a entender melhor o que significa”, ressalta Leonel.

Perdão

Rose afirma que o perdão em relação ao ex-noivo é necessário para suportar os desdobramentos diários do crime e para poder seguir em frente. “Eu já liberei o meu perdão pra ele. Eu sinto que eu tenho que fazer isso porque as sequelas do crime são diárias. Como está na internet, é uma coisa com consequências vivas. Então, eu tenho que perdoá-lo constantemente. Tenho que fazer isso pra poder seguir em paz com a minha vida. Acima de tudo, acho que ele foi uma pessoa extremamente infeliz quando fez isso e que no fundo deve ter se arrependido”.

Rose Leonel declara que sonha em encontrar um novo amor  (Foto: Jackson Yonegura / Arquivo pessoal)

Rose Leonel diz que quer  encontrar um novo amor

(Foto: Jackson Yonegura / Arquivo pessoal)

Futuro

Atualmente protegida pela Lei Maria da Penha, o que impede a aproximação do ex-noivo, a jornalista afirmou ao G1 que busca um novo amor e que pretende se casar novamente. “Eu fiquei um pouco traumatizada com tudo isso. Até já tentei namorar novamente, mas não consegui. É muito difícil conseguir confiar em alguém de novo”.

“Não quero ficar sozinha e tenho o sonho de ainda encontrar um grande amor. Sou uma pessoa muito família. Quero alguém do meu lado para me apoiar e me fazer feliz”, afirma.

Desde que o caso veio à tona, o filho mais velho de Leonel precisou mudar-se para a Europa para, segundo ela, evitar represálias.

Rose Leonel mora com a filha mais nova e, além de atuar na profissão de jornalista, mantém uma ONG, a qual também defende o assunto.

“Eu quero que essa tempestade passe logo para poder me firmar profissionalmente de novo. As coisas ainda não estão como deveriam. E sonho em viver com os meus dois filhos aqui, sem medo de ser feliz”, finaliza, emocionada.

(G1 Paraná Norte e Noroeste, 27/08/2013, http://g1.globo.com/pr/norte-noroeste/noticia/2013/08/apos-fotos-intimas-pararem-na-web-mulher-diz-sofrer-preconceito-diario.html)

'Fui assassinada', diz mulher que criou ONG contra 'vingança pornô'

'Marias da Internet' foi criada para ajudar vítimas de crimes pela internet.

ONG completa um ano e já salvou algumas vidas, afirma Rose Leonel.

Erick Gimenes

Do G1 PR, em Maringá

A jornalista Rose Leonel foi vítima de um crime pela internet, em 2008 (Foto: Arquivo pessoal)

A jornalista Rose Leonel foi vítima de um crime pela internet, em 2008 (Foto: Arquivo pessoal)

A ONG Marias da Internet existe há um ano e já salvou algumas vidas, segundo a criadora dela, Rose Leonel, que mora em Maringá, no norte do Paraná. O trabalho é feito para ajudar mulheres que foram vítimas de 'vingança pornô', ou seja, que tiveram fotos ou vídeos íntimos espalhados pela internet por ex-companheiros.

"Crimes como esses acabam com a vida da vítima. É um crime que não se apaga. A imagem sempre vai estar na internet, já foi espalhada. Posso te dizer que, depois de passar por isso, a pessoa morre, moralmente e até fisicamente, em casos de adolescentes que não resistem a todo esse julgamento da sociedade, por exemplo. Meu objetivo é dar alento, dar a mão, dizer: 'Olha, eu estou aqui e já passei por isso. Quero ajudá-la a salvar sua vida'", explica a jornalista.

Rose é uma das muitas mulheres que vivenciaram e sofreram com a exposição causada por homens com quem se relacionam. Há oito anos, o ex-noivo divulgou fotos íntimas dela pela internet porque, de acordo com a jornalista, não aceitou o fim do noivado. Além de divulgar as imagens, ele ainda insinuou em redes sociais que ela era uma garota de programa. Rose entrou na Justiça e, em 2010, ganhou a causa.

"Fui assassinada. Fui morta moralmente. Hoje, eu ainda estou em recuperação, dia a dia. Não vai passar. Eu sofri com isso e decidi criar a ONG no auge da minha dor. Eu sei o que é estar desamparada em um momento desses. Em muitos casos, até a família se afasta e vira o rosto para você", afirma Rose.

Como funciona

'É a minha bandeira', diz jornalista sobre o site. (Foto: Reprodução)

'É a minha bandeira', diz jornalista sobre a ONG

Marias da Internet (Foto: Reprodução)

A ONG funciona exclusivamente pela internet, como uma consultoria para vítimas de crimes virtuais. Por meio do site da Marias da Internet ou pelo Facebook, as mulheres contam as histórias pelas quais passaram, em mensagens que chegam diretamente para Rose. A jornalista lê, analisa e entra em contato com a pessoa que precisa de ajuda.

O primeiro passo é sempre o mesmo: oferecer uma palavra amiga, segundo ela. "Faço os primeiros socorros", define. "Ligo para a pessoa e tento ouví-la. Conto o que passei e acalmo a vítima. Tento mostrar que existe vida após um crime na internet".

Depois da primeira conversa, Rose entra em contato com uma equipe de profissionais especializados em crimes pela internet, para oferecer assessoria à vítima. No time há advogados, peritos digitais e psicólógos, por exemplo - todos voluntários.

O grupo se mobiliza e aconselha a vítima sobre o que fazer e como agir a partir do crime. Além disso, os voluntários da ONG, incluindo Rose, também visitam escolas e proferem palestras em locais para os quais são convidados.

"O objetivo é informar, orientar e dar suporte para as vítimas. Sou uma mulher que quer lutar por todas as outras mulheres. Isso me fortalece, me faz caminhar. Me sinto sendo útil erguendo essa bandeira, tendo essa missão", ressalta Rose. "Que bom seria se eu tivesse a oportunidade de conversar com todas as mulheres que passaram por isso. Quantas vidas seriam salvas, não é mesmo?".

Onde encontrar

Qualquer mulher pode entrar em contato com a Marias da Internet para pedir ajuda, por meio do site da ONG ou pela página dela no Facebook.

(G1 Paraná Norte e Noroeste, 08/03/2014, http://g1.globo.com/pr/norte-noroeste/noticia/2014/03/fui-assassinada-diz-mulher-que-criou-ong-contra-vinganca-porno.html)

Professora demitida por fotos pelada acusa alunos de vazarem imagens

Do UOL*, em São Paulo

07/08/2014 11h35

Reprodução/http://www.nydailynews.com/

A professora Lekeshia Jones disse que os alunos acessaram o seu telefone secretamente

A professora Lekeshia Jones disse que os alunos acessaram o seu telefone secretamente

A professora americana Lekeshia Jones, 34, está processando o conselho escolar local e um grupo de alunos de 14 anos após ser demitida. O motivo? Ela diz que os alunos invadiram o seu telefone celular e publicaram na internet fotos dela pelada. A docente foi demitida após a divulgação das fotos.

Jones, que dava aulas na Myers Middle School, na Geórgia (EUA), disse que os alunos acessaram o seu telefone secretamente. Para ela, a demissão foi injusta.

O conselho escolar votou pela demissão da professora por considerar que ela foi irresponsável com o telefone e por ela não ter reportado o incidente. O conselho ainda relatou que a professora teve casos de insubordinação nas semanas após o ocorrido.

A professora nega as acusações e diz que o único erro que cometeu foi confiar que os alunos iriam respeitar a sua privacidade. "O que está no meu telefone é problema meu", afirmou Jones a um jornal local.

* Com informações do New York Daily News

(UOL São Paulo, 07/08/2014, http://educacao.uol.com.br/noticias/2014/08/07/professora-demitida-por-fotos-pelada-acusa-alunos-de-vazarem-imagens.htm)

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