Pesquisar este blog

terça-feira, 24 de setembro de 2019

O guru do Bolsonaro e a elite irrelevante

Abigail Pereira Aranha

As pessoas que dizem que o filósofo e escritor Olavo de Carvalho é guru do presidente Jair Bolsonaro parecem não saber nem o que é um guru nem que um guru e o seu discípulo não costumam ficar em hemisférios diferentes, como Bolsonaro em Brasília e Olavo nos Estados Unidos. Mas em vez de abordar as ignorâncias e as contradições dessas pessoas, vou destacar que algumas delas são jornalistas, professores universitários, políticos, celebridades ou (esses sim) autoproclamados filósofos. E vou explicar por que esse detalhe é importante.

Os socialistas sabiam o que estavam fazendo quando ocuparam todos os meios produtores e divulgadores de alguma forma de informação, cultura ou conhecimento técnico-científico, além de construírem organizações populares próprias, antes de chegar ao poder por via eleitoral ou por revolução. De um lado, eles divulgavam as suas próprias ideias; do outro lado, eles tiravam o espaço de expressão (e defesa) das ideias contrárias e dos seus defensores. Eles também sabiam da importância das ideias, desde a cultura popular e correntes de pensamento acadêmicas até um regimento interno da Administração Pública.

A própria eleição do presidente Jair Bolsonaro mostra que algumas ideias e alguns sentimentos que o levaram à vitória estavam espalhados entre muito mais brasileiros que uma pequena militância visível. Se os 57 milhões de brasileiros que o elegeram são chamados de "elite branca", "fascistas" ou até "bots" pelos opositores na imprensa e nas universidades, isso mostra como esses opositores e o seu candidato se deram a obrigação de merecer a derrota.

O Partido dos Trabalhadores não perdeu a eleição para Jair Bolsonaro ou para a direita. O PT e os seus apoiadores perderam a eleição para o mundo real e para o povo de verdade (como os liberais perderam para o próprio PT na eleição do Lula). Eles são feministas que as mulheres não levam a sério, um Movimento Negro em que os negros não se interessam, um Movimento LGBT do qual gays e lésbicas do povo de verdade querem distância. Portanto, se os maiores jornais do país forem lotados de esquerdistas, isso ajuda pouco a esquerda. Porque se um jornalista de esquerda usar a sua coluna para a militância de que faz parte, ele não vai ter muitos leitores.

Pela sua própria natureza, o único veículo que ficou fora da posse da militância socialista é a internet. Mas ainda antes da internet, os jornais e as universidades já estavam perdendo a credibilidade e a relevância por darem espaço para a esquerda. Mas não vamos dizer que um professor universitário, um jornalista ou um artista não sabem o que é ter visibilidade: eles têm quando estão o professor na universidade, o jornalista num grande jornal, o artista no "show business"; e todos eles quando ganham 10 minutos de fama na "mainstream media". Mas a visibilidade é da estrutura que lhes dá espaço, não deles próprios.

E nós temos visto um pelotão de atores, cantores, escritores e humoristas aparecer nas redes sociais e na "mainstream media" para defender ideias progressistas, mas essas pessoas são conhecidas por um talento medíocre. É porque assim como o movimento socialista já teve uma atividade intelectual decente, também já teve uma produção artístico-literária decente. Uma obra artística ou literária pode ensinar valores, transmitir mensagens, inspirar sentimentos ou produzir reflexões, algumas obras artísticas sem usar uma palavra. E na esquerda, assim como a parte intelectual ficou idiota, a parte artístico-literária ficou cafona. Antes disso, uma cena de nudez feminina ou de sexo de uma obra artística ou de u'a manifestação de fundo esquerdista podia trazer enriquecimento cultural, de reflexão sobre coisas erradas na sociedade[1] (não só o puritanismo). Hoje, uma cantora pop de talento medíocre usa erotismo vulgar para atacar o Cristianismo, a heterossexualidade masculina ou um político de direita.

Por sinal, jornalistas e professores universitários em geral são tão homogeneamente burros ou mentirosos que com um texto de 3.000 caracteres para responder um deles, eu ou você podemos destruir uns 10.000 ao mesmo tempo. Mais: quando Olavo de Carvalho diz que 50% dos universitários brasileiros são analfabetos funcionais (pessoas que sabem ler mas não entendem bem o que leem), alguma pessoa de nível universitário diz que ele é anti-intelectual; quando Jair Bolsonaro critica mentiras da imprensa tradicional contra ele mesmo, algum jornalista diz que ele é contra a imprensa; quando ambos criticam livros e obras artísticas de mau gosto feitas por ativistas de esquerda, algum escritor ou artista diz que eles são contra a cultura. Mesmo quando a crítica é individual, nenhuma dessas pessoas se defende como indivíduo, mas defende o meio a que pertence, como a "mainstream media", o meio universitário ou o "show business". Parece curioso? Isso acontece porque essas pessoas devem aos ambientes onde trabalham (e onde fazem militância de esquerda) uma valorização e uma fama muito maiores do que merecem. Também é de lá que elas ganham seu dinheiro, como profissionais regulares, de formas desonestas ou ambos. Ao mesmo tempo, essas pessoas estão em um ambiente onde o mérito profissional e a excelência intelectual parecem muito valorizados para quem está de fora, mas lá dentro são quase desnecessários ou até perigosos. Isso não leva só à mediocridade, também leva à uniformidade. No meio universitário, a criatividade, a inteligência e um pensamento diferente podem prejudicar não uma carreira acadêmica, mas uma nota de prova do primeiro ano de graduação.

Mais uma coisa curiosa: se guru é uma autoridade intelectual, moral e espiritual pelo menos para os adeptos da religião (ou seita), porque há pessoas que usam "guru do Bolsonaro" como termo pejorativo? Não é porque elas foram libertadas da ignorância pelo Ateísmo. É porque no resto do mundo, ter inteligência e conhecimento costuma ser fonte de autoridade; no Brasil, é fonte de deboche. Por exemplo, se você está em uma conversa informal e alguém fala uma atrocidade em Bioquímica, você demonstra conhecimento em Bioquímica ao responder e a pessoa não tem o que responder, a pessoa pergunta, como zombaria, se você tem formação em Medicina. Quem considera a formação técnico-científica e o que tem nome de vida intelectual como trampolim salarial não tem desenvolvimento pessoal para ter inveja de uma pessoa inteligente, e parece não conceber o que é uma pessoa com luz própria. Ser ouvido por um público, ainda mais que inclui um político, por ter uma competência moral-intelectual notória também é algo que essa pessoa não imagina.

E também há uma confusão mental misturada com cinismo e corporativismo entre esses esquerdistas que conquistaram espaços: o ambiente, como a imprensa ou a universidade, não tem mais a função que professa como razão de existir, mas precisa se passar como se ainda tivesse e como se fosse a autoridade na atividade. Portanto, quem tem a estatura intelectual e técnica que um membro médio deste grupo devia ter e não tem é visto em primeiro lugar como um fanfarrão e falsário.

Vou dar três exemplos disso tudo. Débora Diniz teve seu artigo "Venha debater comigo, Olavo de Carvalho" publicado na revista Época. "Debora Diniz é antropóloga, professora da Universidade de Brasília e pesquisadora da University of Brown"[2]. Lead: "O guru de Bolsonaro afirma não existir acadêmicos no Brasil à sua altura. Eu discordo. Vamos falar sobre um tema que lhe é caro? Aborto!" Descrição no Twitter: "Professora da Faculdade de Direito da UnB. Pesquisadora do Centro de Estudos Latinoamericanos e Caribenhos da Universidade de Brown. Colunista El País e Marie Claire. Tuítes sobre feminismo, saúde, política e direitos."[3]. Antes de 17 de março, quando o artigo foi publicado, você tinha ouvido falar dela?

Dizem os antiolavistas que Olavo de Carvalho é um astrólogo que se intitula filósofo[4]. Mas dois deles se apresentam no YouTube um como "Filósofo Paulo Ghiraldelli"[5] e outro, Henry Bugalho, como "filósofo e escritor"[6]. Eu não duvido de que eles tenham diplomas autênticos de graduação ou pós-graduação em Filosofia, mas parece que isso é suficiente para alguém se dizer filósofo sem ser considerado farsante. Mesmo que o diplomado recuse um desafio público de um autointitulado filósofo para debater com ele sobre qualquer tópico de Filosofia à sua escolha (do desafiado), como fez o professor de Filosofia da USP Renato Janine Ribeiro.[7] Ops! Agora são 4 exemplos.

"Filósofo Paulo Ghiraldelli", juntando uns diplomas de Filosofia, um currículo de professor universitário e mais alguns ataques a Olavo de Carvalho e Jair Bolsonaro, tem 341 mil inscritos; Henry Bugalho tem 300 mil inscritos; Débora Diniz tem 83,5 mil seguidores no Twitter. O número de inscritos no YouTube ou seguidores no Twitter dos dois professores universitários é uma boa medida de quem sabe e aprecia qualquer coisa que eles tenham falado ou escrito. Somando os números redondos, 725 mil. Olavo de Carvalho tem 782 mil inscritos. Está certo que é errado usar a popularidade como medida de qualidade, mas um professor universitário médio ou um colunista médio de um grande jornal chegaram ao ponto de perder para pessoas intelectualmente e moralmente qualificadas também em quantidade. Não só em quantidade de leitores e ouvintes, às vezes também em quantidade de "likes" em um "pau" nos comentários de uma postagem do seu próprio perfil de rede social.

Eu mesma tenho dois blogues de alcances modestos (2.000, 5.000 acessos por mês) e eu nunca tive 1.000 amigos no Facebook ou 200 inscritos na minha conta do YouTube. E eu tenho pessoas que abriram contas no Google Plus e no VK para me acompanhar. Eu tenho amigos no Facebook e no Twitter que sempre que veem uma notícia relacionada a nudez, sexo, Feminismo ou Direitos Humanos dos Homens e Meninos, eles compartilham comigo, às vezes eles me sugerem escrever um texto sobre aquilo. Eu descobri pessoas que eu nem conhecia que gostaram de textos meus e compartilharam. Alguns leitores pensam em me comer pelos textos que eu escrevo, e alguns já me disseram isso. E como o meu blogue com sexo explícito está com menos leitores que o outro, eu sei que é pelas minhas ideias mesmo.

E eu pensei em escrever tudo isso porque eu conheci na semana passada os rapazes n° 308 e n° 309 da minha lista de aventuras sexuais, e quando eu tirei a roupa e eles viram o meu corpo, eles reconheceram as formas da bonequinha da minha imagem de perfil (porque na rua, meu corpo é muito bem disfarçado) e disseram que eram meus leitores. Eles estavam muito entusiasmados comigo. As minhas aventuras costumam ser boas, mas essa pra mim também foi um prazer especial porque a minha buceta conheceu os paus de dois leitores.

Uma professora universitária comum e uma jornalista comum não sabem o que é receber tudo isso que eu recebo.

NOTAS E REFERÊNCIAS:

[1] Por exemplo, a cineasta Fernanda Pessoa conta no documentário "Histórias que Nosso Cinema (Não) Contava" que a pornochanchada, um antigo gênero de cinema brasileiro que misturava comédia com nudez ou sexo explícito, colocava em discussão aqui ou ali alguma questão social, inclusive uma alusão à morte do jornalista Vladimir Herzog no filme "E Agora José? - A Tortura do Sexo". Um dos artigos sobre isso: "Como a pornochanchada falou do Brasil sob ditadura militar entre cenas de sexo", UOL Entretenimento, 18 de setembro de 2018, https://entretenimento.uol.com.br/noticias/redacao/2018/09/18/como-a-pornochanchada-falou-do-brasil-sob-ditadura-militar-entre-cenas-de-sexo.htm.

[2] "Venha debater comigo, Olavo de Carvalho", Debora Diniz, Época, 17 de março de 2019, https://epoca.globo.com/venha-debater-comigo-olavo-de-carvalho-23525662.

[3] https://twitter.com/Debora_D_Diniz

[4] Captura de tela: "Resposta a Débora Diniz", Olavo de Carvalho, 19 de março de 2019, https://www.youtube.com/watch?v=vOdxGDMzS2Q.

[5] Captura de tela: "A filosofia explica Bolsonaro", Filósofo Paulo Ghiraldelli, 19 de setembro de 2019, https://www.youtube.com/watch?v=GiooGj9oObM.

[6] Captura de tela: "Revelando o segredo de Olavo de Carvalho", Henry Bugalho, 17 de setembro de 2019, https://www.youtube.com/watch?v=q613Obv_7qc.

[7] "Desafio público a um fanfarrão uspiano", Olavo de Carvalho, 14 de setembro de 2013, reproduzido com o título "O filósofo Olavo de Carvalho desafia professor da USP Renato Janine Ribeiro" em http://www.literature.jex.com.br/literatura/o+filosofo+olavo+de+carvalho+desafia+professor+da+usp+renato+janine+ribeiro.

Texto original em português sem fotos e vídeos de putaria no A Vez das Mulheres de Verdade: "O guru do Bolsonaro e a elite irrelevante", https://avezdasmulheres.blogspot.com/2019/09/o-guru-do-bolsonaro-e-elite-irrelevante.html.
Texto original em português com fotos e vídeos de putaria no A Vez dos Homens que Prestam: "O guru do Bolsonaro e a elite irrelevante", https://avezdoshomens.blogspot.com/2019/09/o-guru-do-bolsonaro-e-elite-irrelevante.html.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Abigail Pereira Aranha no VK: vk.com/abigail.pereira.aranha
E-mail: saindodalinha2@gmail.com

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

AddThis