Meus amigos e meus inimigos, eu já tinha um tempo em que estava pensando em escrever sobre aquele programa Chaves, que dizem ser humorístico, e hoje, 08 de fevereiro de 2014, foi coincidência de ter esta charge no jornal O Tempo:
Depois eu comento sobre a charge e o chargista, e o que isso tem a ver com o Chaves (o do México, não o falecido da Venezuela).
O seriado Chaves deixou de ser gravado na década de 80, e de lá até hoje está sendo repetido na televisão brasileira pelo SBT. Tem muita gente que gosta, dizendo que ainda consegue rir mesmo já tendo visto o episódio várias vezes e que o seriado consegue fazer sucesso sem mulher seminua ou palavrão. E por quê? Porque é humor para gente medíocre, de espírito e de intelecto. As piadas quase sempre são ataques pessoais de baixo nível, só pra começar.
Na vila todos são pobres, menos o Quico e a Dona Florinda. Não tem um episódio (ops, tem um só) em que a Dona Florinda não chama o Quico dizendo "não se misture com essa gentalha" (o Seu Madruga), mas não sabemos por que eles nunca saem de lá. E antes da Dona Florinda comprar um restaurante, o único proletário na vila era o Jaiminho carteiro, tirando o Seu Madruga, cada vez em um trabalho informal diferente. Os únicos que são "alguém na vida" são o Seu Barriga, dono da vila, e o Professor Girafales. Respectivamente, um gordo de óculos e um magrelo alto. O Seu Barriga leva uma pancada do Chaves, sempre sem querer, toda vez que vai para a vila cobrar o aluguel que o Seu Madruga deve há 14 meses. O Professor Girafales é o professor das crianças da vila e do filho do Seu Barriga (o Nhonho, que é outro gordo), não consegue dar uma aula sem interrupção nem fazer uma pergunta à classe sem sair asneira. Ah, e todos os alunos são burros. E ele é namorado da Dona Florinda, que além de feia e nunca sair de casa sem aqueles rolinhos no cabelo, é machorra e esnobe (ou seja, ou ele é iludido ou está numa seca miserável).
Ah, e não tem nada indecente no programa? Mas dá pra fazer piada com indecência? Dá. Os leitores homens mais velhos se lembram da atriz pornô Rebecca Bardoux? Virou comediante. Quando eu tiver 50 anos como ela tem, eu vou ter um currículo igual ao dela, hehehehe. Ou seja, o problema não é o palavrão, a insinuação sexual ou até o sexo explícito na piada. O problema é quando o piadista é fraco e coloca baixaria para salvar a piada. Aliás, se um programa humorístico brasileiro típico mostra como fazer piada ruim com mulher boazuda seminua e alusões a sexo, o Chaves mostra como fazer piada ruim sem isso.
Mas essa falta de "sexualidade" no programa, mesmo que fosse necessária para fazer um bom programa de humor, foi até exagerada. Já se deu conta de que o único casal do programa é de namorados (Professor Girafales e Dona Florinda)? As crianças não têm os dois pais. O Chaves é órfão. A mãe da Chiquinha, a mãe do Nhonho, cadê? O pai do Quico, que mal é mencionado, morreu. Fora as crianças, é todo mundo velho e esquisito, fora a mãe da Paty.
Mas fora as palhaçadas de circo e as besteiras na sala de aula do Professor Girafales, a única coisa que sobra, e nem todos os episódios têm isso, é um pouco de sessão miséria: o Chaves roubando comida ou o Seu Madruga quase sendo despejado.
Fora que as crianças são adultos caracterizados como crianças.
Mas pouco antes de acabar o Chaves, como seriado, no México (fim da década de 80), era governo militar aqui no Brasil e em outros países da América. O único governo militar que continua até hoje é o de Cuba, hehehehe. Mas no Brasil ainda existiam uns piadistas criticando o governo ou a situação social, como o Henfil. Mas se naquele tempo havia censura, ou se naquele tempo o público não achava muita graça em uma piada sobre política, hoje a piada é censurada. Piada inteligente é quase crime.
Hoje, se a piada desagradar negros, mulheres, homossexuais, nordestinos, eleitores do PT, é processo, denúncia e campanha pelas redes sociais. A violência contra homem pode ser piada, mas uma verdade crítica às mulheres em uma piada boa vira pretexto para acusar o autor de defender o estupro, a misoginia, a violência contra a mulher. Já viu aquela peça portuguesa do século XVI, do Gil Vicente, "Todo Mundo e Ninguém"? E sabia que aquele trecho de 1 Coríntios 16:34 "as más conversações corrompem os bons costumes" é um trecho de uma comédia grega de Menandro (ca. 342 a.C. - 291 a.C.)? Eu tenho quase certeza de que isso acontece em Portugal ou na Inglaterra, mas no Brasil de hoje você não faz uma obra de humor deste nível, que faça pensar alguma coisa que não seja lavagem cerebral lesbocomunista, sem receber no mínimo um protesto.
Provas disso são os dois artigos que seguem depois deste texto. O primeiro é sobre o processo no qual o chargista Duke, daquela charge no começo do texto, foi condenado. E o assunto era futebol, o árbitro foi malhado na charge, abriu um processo e ganhou. O Duke e a Sempre Editora, que produz o jornal O Tempo, foram multados. O segundo texto é "Programas humorísticos lideram lista de processos" (do departamento jurídico das emissoras de televisão), publicado no Consultor Jurídico. E vocês vão ver que nem sempre o alvo da piada é um político. Ou seja, a censura é democrática (nossa!).
Ah, e tem também o caso do Joselito Muller, que fez uma piada em outubro de que a secretária dos Direitos Humanos Maria do Rosário chorou ao ver a foto de um ladrão baleado e a Secretaria denunciou o blogue dele. Em dezembro (dois meses depois), mostraram umas fotos de bandidos decapitados no Maranhão e ela foi pro banheiro passando mal.
Mas é isso. Você sabe que o país virou palhaçada quando o jornal parece estar de brincadeira e a página humorística parece falar sério. Em um país com líderes palhaços e povo ridículo, só bobos da corte vivem em paz, porque dizer a verdade parece piada e uma boa piada é atentado à democracia.
Abigail Pereira Aranha
Condenação repercute no Brasil e Duke ganha apoio nas redes sociais
Chargista recebeu diversas manifestações de apoio, entre eles do jornalista Marcelo Tas, apresentador do programa CQC, da Rede Bandeirantes
Em sua página oficial no Facebook, Duke postou uma foto com a tarja de censurado
PUBLICADO EM 29/01/14 - 19h58
DA REDAÇÃO
Condenado pela 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais após a publicação de uma charge sobre a arbitragem do jogo entre Cruzeiro x Ipatinga, válido pelas semifinais do Campeonato Mineiro de 2010, o cartunista Duke, da Sempre Editora, responsável pela publicação dos jornais O TEMPO e Super Notícia, recebeu nesta quarta-feira o apoio de importantes figuras públicas, além de inúmeras mensagens de solidariedade nas redes sociais em relação ao caso que está sendo tratado como um ataque à liberdade de imprensa no Brasil.
A matéria veiculada pelo O TEMPO e Super Notícia, onde o caso é detalhado - inclusive com a informação de que o árbitro Ricardo Marques Ribeiro, autor da ação, trabalha como assessor na mesma Câmara onde o caso foi julgado -, recebeu milhares de compartilhamentos nas redes sociais. O jornalista Marcelo Tas, apresentador do programa CQC - Custe o que custar, da Rede Bandeirantes, foi um dos que saíram em defesa do companheiro de imprensa.
"Assim caminha a liberdade de expressão no Brasil: todo meu respeito e apoio ao chargista mineiro Duke, que sofre uma tentativa de mordaça por um juiz de futebol! Absurdo total!!?!?!?!?", escreveu Tas, considerado pela revista Forbes Brasil uma das 100 pessoas mais influentes do país, em sua página oficial no Facebook.
Outro que também expressou sua indignação com condenação foi o também cartunista mineiro Quinho. "Todo o meu apoio ao Duke, diante da decisão absurda da Justiça. O árbitro de futebol, ao qual foi dado o ganho da causa, é assessor do TJ..", postou no Facebook.
A página de entretenimento "Humor Esportivo", conhecida pelas sátiras ao futebol brasileiro, muitas delas à arbitragem e ao STJD, também abraçou a causa do chargista. "Absurdo!!!! Até a liberdade de expressão as pessoas estão perdendo. Uma das coisas que achamos extraordinária é como os chargistas têm o poder de transformar fatos em desenhos, com crítica, bom humor e atingindo o seu público de uma forma admirável diversos temas em suas charges! Só falta essa moda pegar...", destaca os administradores do site em sua conta no Facebook.
A charge e a condenação
Na ilustração, uma raposa aparece atropelada, além de um carro de polícia e dois personagens, o primeiro deles um torcedor, enquanto o segundo é um policial. Um diálogo é travado e o torcedor diz: "Primeiro o juiz assaltou o Tigre. Em seguida, o Tigre atropelou a Raposa". Por sua vez, a autoridade policial responde "Calma aí, uma ocorrência de cada vez".
A ilustração foi considerada ofensiva pelo árbitro da partida, Ricardo Marques Ribeiro, que entrou na Justiça alegando danos morais, além de um pedido público de retratação. O caso deve ganhar desdobramentos. Tanto a Sempre Editora quanto o chargista foram condenados a pagar R$ 15 mil ao árbitro.
O Tempo, Belo Horizonte, 29/01/14, http://www.otempo.com.br/superfc/condena%C3%A7%C3%A3o-repercute-no-brasil-e-duke-ganha-apoio-nas-redes-sociais-1.780839
Programas humorísticos lideram lista de processos
Os principais programas humorísticos na televisão como Pânico, da Rede TV!, CQC, da Band, e Casseta & Planeta, da TV Globo, estão dando trabalho para o departamento jurídico das emissoras, com o acúmulo de processos judiciais. O principal tema desses programas é azucrinar celebridades, perseguir políticos e fazer graça com vergonhas nacionais, segundo informa o portal do Estadão.
A maior pilha de processos é do Pânico na TV! No ar desde 2003, o programa lidera o ranking de processos da emissora. A encrenca mais recente foi com outra emissora. A Globo decidiu processar o programa por invasão de propriedade e captação de imagens não autorizadas. O Pânico mostrou os bastidores do Big Brother Brasil 10, em quadro chamado "O invasor", em que um membro da equipe da Rede TV! se infiltrou na torcida de uma participante do reality show. "Qual o problema de mostrar o Bial [apresentador do programa] jogando banho de cheiro na plateia?", disse Emílio Surita, líder do grupo. "O estranho é como as coisas acontecem. Quando sobrevoamos a Fazenda da Record, avisando os participantes com uma faixa que o Michael Jackson havia morrido, a Justiça foi acionada mais rápido do que nunca", diz Emílio. "Fizemos no sábado e, no domingo, às 8 horas da manhã, tinha um oficial de justiça na RedeTV! com uma liminar impedindo a exibição da brincadeira no Pânico. A Record achou um juiz no sábado de madrugada?", questiona.
Na época em que corriam atrás de pés ilustres para as "Sandálias da Humildade", o programa foi processado por Carolina Dieckmann. Os humoristas foram presos por tentar chegar à janela do apartamento da atriz, no Rio, com uma escada. Em outro caso, após alguns rounds na Justiça, a atriz Luana Piovani conseguiu uma indenização do programa de R$ 150 mil por perseguição, e Dado Dolabella, seu namorado na época, mais R$ 50 mil. Com Preta Gil, a briga judicial começou após tentarem entregar a ela um ovo de Páscoa gigante.
A turma do Casseta & Planeta também não facilita a vida dos advogados da Globo. Entre os que processaram os humoristas estão o ex-presidente Fernando Collor, Jorgina de Freitas, acusada de fraudar o INSS, e o empresário do Papa Tudo, Arthur Falk. Em 1997, o Casseta foi alvo de mais de 130 ações movidas por policiais militares de Diadema, região metropolitana de São Paulo. As ações, que pediam R$ 200 mil cada uma por danos morais, não foram para frente. Os humoristas também foram vetados na Parada Gay em São Paulo e processados por uma entidade gaúcha, por causa de piadas questionando a masculinidade dos sulistas.
Segundo o humorista Cláudio Manoel, a época em que os programas podem levar mais processos é a das eleições. Para evitar confusão, piadas sobre os candidatos ficam na gaveta. "Se falar da Dilma, tem de falar do Serra, e vice-versa. Sem contar os outros candidatos, que podem exigir direito de espaço."
Peritos em perseguir os tais "senhores de terno" do Congresso, o CQC também coleciona processos ao longo dos quase três anos de vida. Nenhum com ganho de causa, garante o diretor Diego Barredo. A maior parte dos políticos acredita ter a imagem maculada pelas brincadeiras. Marcelo Tas, o líder dos "homens de preto", define como censura a horda de processos que se acumulam contra os humoristas. "A pressão psicológica e financeira causada pelas ameaças de processo joga os artistas, jornalistas e empresas de comunicação contra a parede. A palavra para definir essa pressão é uma só: censura!".
Tas diz que tinha muito mais liberdade durante a ditadura e a transição para democracia do que agora, época em que humoristas são processados "simplesmente por expressar opinião ou fazer crítica". "Há uma escalada galopante do politicamente correto que tenta aplainar e uniformizar toda forma de pensamento inusitado", critica. "Há um retrocesso grave e preocupante quanto à liberdade de expressão no país."
Juntamente com o colega Rafinha Bastos, Danilo Gentili é um dos campeões de processos no programa. Segundo ele, a ordem na casa é para que os repórteres não se preocupem com ibope ou Justiça. Depois, é a direção do humorístico quem resolve o que vai para o ar.
Consultor Jurídico, 25/04/10, http://www.conjur.com.br/2010-abr-25/programas-humoristicos-lideram-lista-processos-emissoras-tv